Se você tem constantes tonturas e sensação de que está tudo rodando (vertigem), se escuta um zumbido no ouvido, diminuição de audição ou perda total desta, sugiro que procure um médico, pode ser labirintite! Esta condição é uma inflamação que se manifesta depois dos 40 ou 50 anos, mas isso não significa que pessoas mais jovens não possam manifestá-la também, já que o excesso de álcool, café, fumo, estresse e ansiedade são fatores de risco que podem causar a labirintite.
Nesse texto apresentamos o que é a labirintite, abordamos a anatomia do labirinto, discutimos uma condição clínica chamada de Doença de Ménière e trouxemos uma possibilidade de reabilitação por meio de realidade virtual.
O termo “labirintite” usado no dia a dia não é muito adequado, o termo correto seria “labirintopatia”, que significam doença que acontece no labirinto. Mas afinal, o que é o labirinto? O labirinto se refere às cavidades ósseas do nosso ouvido interno, que é preenchido por um líquido aquoso (Figura 1). Quando nos mexemos, principalmente quando mexemos a nossa cabeça, esse líquido dentro do nosso ouvido mexe também e estimula células sensoriais espalhadas no canal auditivo. A partir disso, são enviadas informações da nossa posição no espaço para o cérebro. A estrutura do labirinto é dividida em duas partes: a cóclea e o sistema vestibular.
A cóclea (Figura 2) é responsável pela audição, está em um meio aquoso e tem cerca de 35 milímetros de comprimento. Ela fica enroladinha em formato de caracol dentro do nosso ouvido interno. Os ossículos (martelo, bigorna e estribo) transmitem o sinal mecânico da onda sonora e fazem contato direto com a cóclea, e é por ela que acontece a transdução do sinal. Esse processo ocorre por causa das células ciliadas especializadas da audição, mais especificamente no órgão de Corti. Agora, o sistema vestibular, ou órgãos vestibulares (veja a Figura 3), é responsável pelo nosso equilíbrio. Ele está dividido em 3 estruturas: sáculo, utrículo e canais semicirculares. Assim como a cóclea, os canais semicirculares estão preenchidos por líquido. Eles têm a função de registrar a direção e a extensão do movimento circular (quando viramos o corpo ou a cabeça, por exemplo). São 3 canais que servem como referência para os movimentos rotativos que fazemos. Cada um desses canais fica em planos diferentes e detectam a aceleração angular da cabeça em qualquer direção do espaço tridimensional.
Depois dessa apresentação da anatomia do labirinto, vamos descobrir o que de fato é labirintite, ou melhor, labirintopatia. A labirintite se refere a um tipo de inflamação no labirinto membranoso, mas também pode ser causada por algum tipo de infecção viral ou bacteriana, reação a um determinado remédio, e uma outra causa também pode ser o envelhecimento, como comentamos no início do texto. As doenças no labirinto podem ocorrer quando existe alguma alteração nos órgãos vestibulares e o cérebro recebe informações erradas da nossa posição no espaço.
Por exemplo, uma pessoa que tem algum problema nos órgãos vestibulares, mesmo ela estando parada, o líquido do labirinto pode se mexer e levar a informação para o cérebro de que o corpo está em movimento. Isso é o que causa os principais sintomas da labirintite: tontura e vertigem. Uma crise de labirintite pode durar por minutos ou até mesmo horas, porém, os sintomas como tontura, vertigens, náuseas, zumbidos, dor no ouvido, entre outros, podem durar dias.
Existe uma doença incurável chamada Doença de Ménière (também chamada de hidropisia endolinfática) que afeta a função vestibular e a audição. Essa doença ocorre por causa de um excesso de produção, e consequente pressão elevada, do líquido no labirinto (veja a Figura 4). A pessoa com doença de Ménière sofre crises do sistema vestibular repentinamente e de uma forma violenta, o que inclui vertigem, náuseas, zumbidos e percepção dos sons como muito agudos. É uma doença que progride aos poucos e, nos estágios mais graves, a audição e a função vestibular da pessoa podem parar de funcionar definitivamente. Não existe cura por enquanto, porém, a cirurgia pode ajudar a drenar o excesso de líquido no labirinto, o que faz com que a pressão do ouvido interno seja reduzida e diminua um pouco os sintomas.
Em um estudo nacional conduzido na Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), a pesquisadora Adriana Pontim Garcia e colaboradores tentaram descobrir se era possível haver uma reabilitação do sistema vestibular com o uso da realidade virtual na doença de Ménière. Foram selecionadas 44 pessoas diagnosticadas com a doença e que apresentaram tonturas, e então a amostra foi dividida em 2 grupos: experimental e controle. Ambos fizeram o uso de betaistina (remédio indicado para o tratamento da síndrome de Ménière) e de dieta alimentar, porém, apenas o grupo experimental passou por 12 sessões de reabilitação com realidade virtual. Eles analisaram os efeitos incapacitantes das tonturas antes e depois do término da reabilitação vestibular com o uso da realidade virtual do grupo experimental e compararam com o grupo controle.
No grupo controle, houve uma redução de tontura, mas não houve diminuição dos valores no questionário de qualidade de vida avaliados pelo Dizziness Handicap Inventory (DHI). Já no grupo experimental, houve não só uma melhora da tontura, mas também uma melhora na qualidade de vida. Houve uma melhora na habilidade de manter o equilíbrio corporal e ao se movimentar. Os pesquisadores observaram também que houve uma melhora nos pacientes que fizeram terapia psicológica, usaram o medicamento betaistina e fizeram a reabilitação por meio da realidade virtual. Em suma, foi constatado com essa pesquisa que o uso da realidade virtual na reabilitação do sistema vestibular de pessoas com doença de Ménière funciona! Houve uma melhora da tontura, da qualidade de vida e do limite de estabilidade de pacientes com a doença.
As doenças do labirinto podem ser muito sérias, como é o caso da doença de Ménière. Existem várias outras doenças do labirinto, como a vertigem posicional paroxística benigna, cinetose, neurite vestibular, entre outras. É importante conhecer os sintomas das labirintopatias para saber quando está na hora de procurar um otorrinolaringologista para se tratar. A labirintite altera, sobretudo, o nosso equilíbrio, e sem equilíbrio não conseguimos fazer quase nada: não vamos conseguir andar direito, sentiremos ânsias e vertigens frequentemente. Compreender como a labirintite ocorre é importante para se cuidar e, caso necessário, procurar tratamento.
Referências
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De Castro, A. S. O., Gazzola, J. M., Natour, J., & Ganança, F. F. (2007). Versão brasileira do Dizziness Handicap Inventory. Pró-Fono Revista de Atualização Científica, 19(1), 97-104. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-56872007000100011
Garcia, A. P., Ganança, M. M., Cusin, F. S., Tomaz, A., Ganança, F. F., & Caovilla, H. H. (2013). Vestibular rehabilitation with virtual reality in Ménière’s disease. Brazilian Journal of Otorhinolaryngology, 79(3), 366–374. https://doi.org/10.5935/1808-8694.20130064
Schiffman, H. R. (2005). Sensação e Percepção. In H. R. Schiffman: Funções e fenômenos auditivos fundamentais. (5a ed.). (pp. 239-240; 290-293; 296). Rio de Janeiro: LCT.
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Sobre a autora
Maria Eduarda Pereira. Estudante de Serviço Social pela UnB. Tem interesse no curso de Psicologia, em particular pela abordagem humanista. Gosta de passar horas lendo, assistindo séries e tirando fotos de sua gata. Como muita gente, ainda está tentando se encontrar no curso e na UnB, conhecendo várias áreas diferentes.
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Pereira. (2021, 8 de novembro). Labirintite, você sabe o que é? Eu Percebo. https://eupercebo.unb.br/2021/11/08/labirintite-voce-sabe-o-que-e/