Definir emoção não é tarefa simples. Entretanto, uma boa definição de emoção deve conter duas características essenciais. A primeira delas é o substrato neural subjacente, que organiza tanto as respostas aos estímulos emocionais quanto a própria percepção da emoção. Em segundo lugar, não se pode negligenciar que as emoções têm uma função biológica. Elas são importantes para que os animais apresentem respostas comportamentais adequadas, aumentando suas chances de sobrevivência. Este segundo ponto é particularmente interessante.
Os membros da espécie humana vivem em grupos, ou seja, somos seres sociais. Isso implica que somos interdependentes, o que um faz afeta o outro. Assim, nossa sobrevivência depende de sinalizar o que queremos a outrem e de entender as emoções alheias para que possamos prever a ação do outro. É preciso saber rapidamente quem está se aproximando e que sinal emocional este indivíduo mostra.
Essa comunicação emocional pode ocorrer através da linguagem. Contudo, a maior parte dela ocorre através de linguagem corporal, gestos e expressões faciais. Inclusive em uma situação de conflito entre o que é dito e o que é expressado pela face, há uma tendência de que a informação não-verbal seja aceita como a mais confiável. Por isso é tão difícil enganar alguém com um sorriso amarelo ou esconder a decepção ao ganhar um presente que você não desejava. Veja a figura abaixo. Mesmo que o garoto diga que gostou de seu presente, dificilmente alguém acreditará.
A expressão facial de emoção é uma dica fundamental no desenvolvimento e na regulação de nosso comportamento social e interpessoal. Isso fica evidente quando um indivíduo tem dificuldades na percepção ou na expressão de emoções faciais. O resultado é um comprometimento na adaptação social do indivíduo. O exemplo mais óbvio é o de crianças diagnosticadas com algum transtorno do espectro autista. Claramente, elas têm maior dificuldade em identificar e discriminar expressões faciais de emoção, o que repercute dificuldades e prejuízos à sua interação social. Falando em autismo, muitos alunos me perguntaram sobre a moça autista da novela “Amor à Vida. Aqui você encontra um texto bastante interessante sobre o assunto. As pessoas acometidas pela Síndrome de Mobius têm grande dificuldade em estabelecer relacionamentos interpessoais duradouros. Esta condição é um tipo raro de paralisia facial, o que os tornam incapazes de produzir expressões faciais.
A expressão facial de emoção é uma dica fundamental no desenvolvimento e na regulação de nosso comportamento social e interpessoal. Isso fica evidente quando um indivíduo tem dificuldades na percepção ou na expressão de emoções faciais. O resultado é um comprometimento na adaptação social do indivíduo. O exemplo mais óbvio é o de crianças diagnosticadas com algum transtorno do espectro autista. Claramente, elas têm maior dificuldade em identificar e discriminar expressões faciais de emoção, o que repercute dificuldades e prejuízos à sua interação social. Falando em autismo, muitos alunos me perguntaram sobre a moça autista da novela “Amor à Vida. Aqui você encontra um texto bastante interessante sobre o assunto. As pessoas acometidas pela Síndrome de Mobius têm grande dificuldade em estabelecer relacionamentos interpessoais duradouros. Esta condição é um tipo raro de paralisia facial, o que os tornam incapazes de produzir expressões faciais.
Treze anos depois, ele publicou “A expressão das emoções no homem e nos animais” (1872/2000), que é uma das primeiras fontes de informação sobre as emoções dentro da perspectiva evolucionista. Cabe destacar que nove anos antes da publicação deste livro de Darwin, Wilhelm Wundt (1832-1920) publicou um livro de psicologia comparada intitulado “Preleções sobre a mente humana e animal” (1863). Nele, defendia que a mente extrapola a dimensão humana, proposta muito ousada para a época. Ele mesmo, que fundou o Laboratório de Psicologia Experimental na Universidade de Leipizig (1879), considerado o marco de início para o status científico da Psicologia. Leia mais sobre essa história aqui.
Voltando à Darwin, ele descreveu diversas reações emocionais em animais, refletindo sobre sua função biológica e também observou as expressões de emoção em seus próprios filhos e em pessoas de outras culturas. Darwin defendeu a hipótese da universalidade das expressões faciais ao constatar que certos padrões de expressões emocionais e de reconhecimento destas eram semelhantes entre diferentes culturas. Durante a década de 1970, o então professor da Universidade da Califórnia Paul Ekman realizou estudos transculturais que forneceram evidências em favor da hipótese proposta por Darwin. Isso pode ser observado na figura abaixo. Habitantes da Nova Guiné, com pouco estudo formal e pouco contato com outras culturas demonstram a emoção de maneira semelhante aos ocidentais e não têm dificuldade em reconhecer as expressões faciais destes.
A natureza hereditária e não-aprendida das expressões faciais de emoção fica evidente ao verificar-se que não há diferença nestas entre cegos congênitos, que não puderam aprender como expressar suas emoções ao observar os outros, e pessoas com visão normal (vidente). Abaixo, vemos dois atletas de judô comemorando uma vitória. Você consegue dizer qual é cego e qual é vidente? Muito semelhantes, não?
A contribuição de Ekman não parou por aqui. Em seus estudos, revelou-se a existência de pelo menos seis expressões faciais básicas: alegria, tristeza, medo, raiva, surpresa e nojo. Estas emoções básicas foram reunidas por Ekman e seu colaborador Wallace Friesen em uma série de fotografias, chamada “Pictures of Facial Affect” (1976). Este é o banco de dados mais amplamente utilizado nos estudos de expressões faciais de emoção. Abaixo um exemplo de cada uma das emoções consideradas básicas.
Ainda hoje, o grupo de pesquisa liderado pro Ekman é muito influente neste campo de pesquisa. Recentemente, após sua aposentadoria da Universidade, Ekman tem se dedicado a aplicar os achados de sua pesquisa em ferramentas práticas que auxiliam as pessoas a compreender melhor suas emoções, possibilitando uma maior qualidade de vida. Além disso, ele fornece treinamento ao FBI, à CIA e a outros agentes da lei norte-americanos para que a identificação de mentiras durante um interrogatório seja mais acurada. Talvez você já tenha visto o seriado “Lie to me”, cujo enredo se baseia em um grupo de investigadores especialistas em detectar mentiras. O seriado é inspirado nos trabalhos de Paul Ekman e contou com sua colaboração como consultor. Você pode conhecer melhor o trabalho deste notável pesquisador aqui.
Neste mês (fevereiro de 2014) foi publicado um artigo na Current Biology,que questiona a ideia de que seriam seis as emoções básicas. Hipótese essa proposta e defendida por Ekman na década de 1970 e, desde então, corroborada e utilizada por praticamente todos os estudos de expressões faciais de emoção. É um verdadeiro pilar desta área do saber. O trabalho liderado pro Rachael E. Jack da Universidade de Glasgow investigou a dinâmica temporal das expressões faciais através de um programa (Generative Face Grammar) desenvolvido na referida universidade, o qual permite a captura tridimensional de 42 músculos faciais de maneira individual e independente.
Os resultados mostraram que as expressões faciais de tristeza e de alegria são claramente distintas ao longo do tempo. Por outro lado, inicialmente, as expressões faciais de medo e surpresa compartilham um sinal: os olhos bem abertos. O mesmo ocorre com as expressões de raiva e nojo que compartilham o nariz franzido. Ou seja, a sinalização de medo e de surpresa, bem como a de raiva e de nojo, é confusa nos primeiros estágios de processamento. Provavelmente, ambas as características sinalizam perigo: um processo para rápida aproximação (medo/surpresa) e outro para estímulos de perigo estáticos (raiva/nojo). Desta maneira, os autores defendem que as seis emoções básicas, na verdade, podem ser reduzidas a quatro.
Posteriormente, à medida que o tempo passa, a dinâmica de ativação dos músculos faciais transmite sinais que representam as seis emoções básicas clássicas. Jack e seus colaboradores enfatizam que pesquisas semelhantes devem ser realizadas em outras culturas para verificar se estas quatro emoções básicas são realmente universais.
Será que este estudo mudará nossa compreensão sobre as emoções e as expressões faciais? Vamos aguardar.
Referências
Darwin, C. (1872/2000). A expressão das emoções nos homens e animais. Companhia das Letras: São Paulo.
Ekman, P., & Friesen, W. V. (1971). Constants across cultures in the face and emotion. Journal of Personality and Social Psychology, 17(2), 124–129. https://doi.org/10.1037/h0030377
Ekman, P., & Friesen, W. V. (1976). Pictures of facial affect. Palo Alto: Consulting Psychologists Press. 110 pictures, Black and White.
Jack, R. E., Garrod, O. G., & Schyns, P. G. (2014). Dynamic facial expressions of emotion transmit an evolving hierarchy of signals over time. Current biology : CB, 24(2), 187–192. https://doi.org/10.1016/j.cub.2013.11.064
Áudio do post
Siga por e-mail e compartilhe nas redes sociais
Fonte da imagem da capa do post: bbc.com. Crédito: Alamy.
Sobre o autor
Leonardo Gomes Bernardino é Doutor em Psicobiologia pela Universidade de São Paulo e professor do Instituto de Psicologia da Universidade Federal de Uberlândia.
Este texto foi originalmente publicado no Blog Percepto em 09/02/2014.
Termos de reprodução e divulgação do texto
Todos os textos publicados no eupercebo.unb.br podem ser reproduzidos na íntegra ou parcialmente por meios impressos e digitais, desde que não sofram alterações de conteúdo e que a fonte seja mencionada. Como referenciar este texto (normas da APA):
Bernardino, L. G. (2020, 30 de agosto). Você está com medo ou surpreso? As expressões faciais de emoção [Blog]. Recuperado de https://eupercebo.unb.br/2020/08/30/voce-esta-com-medo-ou-surpreso-as-expressoes-faciais-de-emocao/